A resenha abaixo foi escrita por Danilo Julião, 29 anos, professor, morador do Rio de Janeiro.
Ser aceito do jeito que se é e viver um grande amor são metas
que qualquer ser humano busca em toda a sua vida. E nem sempre essas duas metas
acontecem de acordo com o que muitos prezam ser o ideal. Mais do que um filme
que aborda a intolerância, “Poesias para Gael” é uma jornada de
autoconhecimento: o conhecido, o desconhecido, o inesperado. O que poderia ser
uma sucessão de situações clichês ganha profundidade à medida em que as
situações se desenrolam. Gael é um rapaz introspectivo que gosta de escrever poesias
e sofre com a distância do pai e a incompreensão da mãe. Ele também é alvo das
maldades de Eline, cuja diversão é atormentar o protagonista da estória; o
fio-condutor da trama é uma artimanha para provar que Gael gosta de outros
homens e a isca é o namorado de Eline, Hugo.
Por mais que o envolvimento entre os dois pareça rápido e
forçado, é preciso levar em conta o formato compacto da estória e também que
ambos são vistos por representarem os estereótipos: o cara atlético, bonito e
sem atrativos intelectuais e o rapaz tímido, sensível e alvo de chacotas. Foi
preciso assistir o curta algumas vezes para perceber que o clima da estória não
estava apenas no que era dito, mas também no olhar, na expressão dos
personagens. Em vários momentos do primeiro curta, nota-se o que não era dito:
a indiferença e o remorso no olhar da mãe, Helena; o olhar de desconfiança e
sensibilidade em Gael; o olhar de desejo e de amor em Hugo; o olhar de vingança
em Eline. Somos conduzidos durante meia hora para uma estória onde o amor (ou a
falta dele) desperta os mais diversos sentimentos e somos conduzidos para uma
narrativa cheia de matizes sobre como amar e ser amado é importante. Como dizia
Tom Jobim: "fundamental é mesmo o amor, é impossível ser feliz
sozinho".
Hugo e Gael são opostos, isso é verdade, mas ambos se
completam. Se Hugo se transforma na força motriz de Gael, dando-lhe a coragem
necessária para enfrentar qualquer problema, Gael se transforma no sentimento
de Hugo, tornando-o mais dono de si e capaz de ter seus próprios sentimentos.
No clímax do primeiro curta, percebe-se, mediante o embate entre os futuros
amantes, que ambos se completam e querem se completar. Em meio à produções
cinematográficas que abordam o amor entre duas pessoas do mesmo sexo, o grande
atrativo de "Poesias para Gael" é a veracidade impressa nas atuações
dos intérpretes. Victor Neves imprime a Gael uma fragilidade num primeiro
momento e, posteriormente, uma força surpreendente, impondo-se como o
protagonista da trama. Flávio Leimig consegue dar a Hugo os atributos físicos e
a sensibilidade necessárias para encantar o público e fazê-lo torcer pelo
casal. Natalie Smith, por sua vez, adiciona tintas fortes à sua Eline,
especialmente nos momentos em que é revelado o motivo de sua personagem odiar tanto
o protagonista, um entrecho recorrente, mas interessante. Nas mãos de Magda
Resende, Helena se torna uma personagem verossímil, sem arquétipos maniqueístas
e carregada de muitos conflitos.
O primeiro longa constrói as 'poesias'
desse amor novo e polêmico, enquanto o segundo amplia ainda mais os conflitos.
A relação entre Hugo e Gael é ameaçada por uma série de fatores, mas cresce. E
nota-se que não se trata apenas de um amor erótico, o erotismo da primeira vez
dos dois personagens é suplantado pelo romantismo e pela cumplicidade de duas
pessoas descobrindo o amor juntas. Não apenas o amor, mas também buscando a
aceitação. Embora os recursos usados para moviemntar a trama sejam velhos
conhecidos do público (a rejeição da mãe de Gael e da agora ex-namorada de
Hugo, a gravidez indesejada e a doença), eles ajudaram a pontuar ainda mais as
atuações no segundo curta, mostrando que o amor não escreve apenas poemas
alegres e calientes, mas também sonetos tristes, temorosos e até que mostram a
brevidade das coisas. A parte final do segundo curta mostra uma jornada de
redenção para todos os personagens, mostrando como o amor cura traumas, feridas
do passado, resgatam a fé na vida e nos fazem refletir sobre como é mais
importante o carinho do que o julgamento.
(Danilo Julião)